terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Fui e não fui assediada no trabalho


Estou casada com meu ex-chefe há mais de 28 anos. Fui casada com outro ex-chefe por seis anos. Antes de nos casarmos, namoramos. Antes de namorarmos flertamos (o termo soa meio anacrônico, mas não achei nada melhor. Azaração?). Nunca fui assediada por nenhum dos dois. Muito pelo contrário. Desde o início as aproximações foram altamente respeitosas. E mútuas, o que já confere total diferença entre o assédio que é unilateral. Nos dois casos as interações foram construídas por palavras e gestos carregados de afetividade e admiração. Outro ponto que diferencia bem assédio de flerte ou elogio.
Em minha trajetória profissional, porém, outros tantos chefes e pares com quem convivi, me assediaram. Em momento algum confundi assédio com flerte. Assédio traz constrangimento. Não sugere qualquer laivo de admiração ou respeito. No assédio a aproximação se parece  com a de um predador caçando sua presa para devorá-la e, em seguida sair em busca de nova vítima.
Assédios fazem com que nos sintamos vulneráveis, humilhados e desrespeitados. São aproximações com palavras ásperas, rudes e grosseiras, gestos inconcebíveis ou insinuações desagradáveis, para dizer o mínimo. Em alguns casos até mesmo com atitudes grotescas e aviltantes como as famosas “passadas de mão”. Disso fui poupada, felizmente. Com meu temperamento sei que o desfecho teria sido muito infeliz.
Não raro o assédio se dá por parte de profissionais de um nível hierárquico superior que se sentem no direito de subjugar seus subordinados com suas investidas. Que se aproveitam de suas posições dando como certo o silêncio de suas ações, muitas vezes carregadas de ameaças explícitas ou veladas.
Não compartilho da opinião de que estamos levando tudo a ferro e fogo e que não se pode mais elogiar ou flertar alguém no trabalho. Casos como o meu, de pessoas que se casam com colegas ou chefes de trabalho, são muito comuns. Mas posso apostar que as aproximações, nesses casos, se deram de forma beeeem diferente. Assédio é assédio. Elogios e flertes lídimos sempre serão bem-vindos. Fazem com que nos sintamos lisonjeados. Totalmente diferente de falsos elogios ou galanteios que têm como único propósito fisgar sua presa. 
Um olhar diferenciado do que é ou não assédio é importante e tende a frear o “pacto de silêncio” que imperava. Até então, qualquer iniciativa de responder contra as investidas eram fortemente desencorajadas por todos. Prevalecia o famoso “deixa quieto para não criar problemas”.
Assédios são praticados por pessoas prepotentes e desprovidas de empatia. Pessoas que colocam suas vontades e desejos acima de tudo. Que seguem seus impulsos e tratam seus alvos com desprezo. Geram repulsa, mas não encaram isso como um freio para suas ações desagradáveis, inadequadas, deselegantes e constrangedoras. Muitas vezes, inclusive, sentem um prazer doentio com essa postura deplorável. Seus autores desconhecem solenemente uma coisa chamada limite. Não estão preocupados ou atentos em como suas investidas estão sendo recebidas. Simplesmente as disparam. Se acham no direito de fazer o que fazem. Faltam com respeito e não se dão ao respeito. Se julgam imunes a qualquer consequência que os atinja de alguma forma. Avançam sem pudores. São pessoas egocêntricas que visam única e tão somente seu prazer e se deixam levar por seus impulsos, muitas vezes primitivos.
O que me preocupa nesse cenário são as pessoas oportunistas que, por vingança ou qualquer outro motivo torpe, se aproveitam para caluniar pessoas no ambiente de trabalho levianamente, enfraquecendo, assim, essa causa tão importante e necessária nos dias de hoje. Estamos todos discutindo algo muito sério que é a ética. E atitudes levianas e falsas denúncias também ferem a ética.

Andréa Cordoniz
Psicóloga, escritora e Diretora de Desenvolvimento de Pessoas na BMFC Treinamentos Empresariais.

Janeiro de 2018

terça-feira, 10 de outubro de 2017


Seja seu melhor amigo

  



Leticia foi convidada para ser madrinha de casamento da amiga Débora. Queria caprichar no visual e foi às compras. Entrou na sua loja predileta, experimentou diversos vestidos e implicou com todos! Seguiu sua busca em outras lojas. Perdeu as contas de quantos “milhões” de vestidos experimentou. Desiludida e cansada chegou em casa e, aos prantos, telefonou para sua amiga. Débora ouviu seu lamento e disse: Não é pra menos! Você não vê que está enorme de gorda?  Como é que algum vestido pode ficar bem em você? E todas aquelas pizzas e feijoadas que você comeu nos últimos meses? Agora ainda fica choramingando? Francamente! Do jeito que você está não vai ter vestido que fique bem em você!.

Imagino que a essa altura você esteja odiando a Débora! Que esteja achando-a uma das pessoas mais cruéis e insensíveis que você já viu. Que esteja classificando o comportamento dela como devastador e improdutivo, que em nada ajudaria Leticia a se sentir minimamente melhor. Ao contrário, faria com que ela se odiasse ainda mais.

Provavelmente você deve estar se perguntando que tipo de amiga é essa. Que jamais a teria como amiga. Que a queria bem longe de você. Mas o mais chocante é que a Débora não é a Débora. Na verdade, quem disse tudo aquilo para a Leticia foi ela mesma. Quem humilhou, culpou, aniquilou com a Leticia foi ela mesma. E o pior vem agora: isso que Leticia fez consigo mesma, tenho certeza que você também já fez com você. Já foi muito cruel e se detonou quando mais precisava se reerguer. Fazemos muito isso. Mas não deveríamos. Se tal comportamento já nos choca vindo de outra pessoa, imagine vindo de nós mesmos? De alguém com quem, por razões óbvias, não temos como romper, deixar de ver ou evitar conviver. Por isso atente sempre para a maneira como você se trata.

Quando nossa autoestima cai, desabamos para a vida. Nossa relação com nós mesmos e com todos à nossa volta fica imensamente abalada. Autoestima baixa é quando nos vemos muito distantes daquilo que gostaríamos de ser. E nos punirmos por isso não vai, de forma alguma, melhorar as coisas. Se você permite que você mesmo se trate dessa forma, por que não admitiria que outras pessoas façam o mesmo?

Perder o amor próprio abre portas para que quando alguém nos deprecie ou destrate, aceitemos sem contestação. A fala ou gesto do outro funcionará como um eco daquilo que já tínhamos pensado sobre nós mesmos. Conscientemente, ou não, nos diremos: não disse que sou uma pessoa desprezível, ou ruim, ou gorda, ou feia, ou burra..?.

Observe agora como você age com um amigo que lhe procura para desabafar dizendo estar se sentindo um lixo. O que você normalmente faz? Provavelmente o acolhe, o trata com gentileza, com carinho e procura palavras que o conforte e o demova da ideia que está fazendo com que ele esteja se sentindo mal. E se alguém humilha ou ofende alguém que você ama? Imagino que o defenda com veemência. Portanto, aja com você como você agiria com seu amigo. Seja gentil com você. Procure ser cada vez mais uma pessoa melhor, mas durante todo o processo de crescimento seja mais condescendente com você. Isso trará muito mais força para encarar os desafios que a vida apresenta. Cuide-se mais. Depender de outras pessoas para que nos sintamos bem, para que nos sintamos melhores, é muito perigoso. Conte com você. Perdoe-se mais! Ame-se mais! Respeite-se mais! Seja seu melhor amigo.

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Andréa Fanzeres Cordoniz
Psicóloga, Escritora, Consultora de Recursos Humanos, Instrutora de Treinamentos Empresariais e Palestrante.
Psychologist, Writer, Consultant for Human Resources, Trainer for Business Training and Speaker.



terça-feira, 26 de setembro de 2017

criATIVE-SE e faça com que sua vida seja muito melhor!

Segundo uma crença popular, todo homem nascido no Japão deve escalar o Monte Fuji, cartão postal daquele país, pelo menos uma vez em sua vida. Dessa forma, acreditam, o indivíduo ganha uma poderosa benção espiritual e atrai sorte. Talvez isso tenha levado Ichijirou Araya a decidir escalar os seus 3.776 metros de altura, considerada a montanha mais alta do Japão e a 35ª do mundo. Essa empreitada se torna ainda mais desafiadora, considerando as baixas temperaturas do local. No verão, a média no topo varia de 18 a 8º C, mas com o vento forte e constante, a sensação térmica é de alguns graus negativos.
Mesmo diante de todas as dificuldades, Ichijirou não titubeou e, para a surpresa de todos, levou adiante seu intuito. No dia 5 de agosto de 1994 sob um sol morno e preguiçoso, lá foi ele fazer sua escalada.
Considerando que mais de 200 mil pessoas fazem isso todos os anos, a decisão de Ichijirou não seria propriamente uma proeza caso ele não estivesse na ocasião com 100 anos de idade. Isso mesmo que você leu: Ichijirou escalou o monte Fuji aos 100 anos de idade.
Maude Tull, uma simpática americana, prestou exame de direção, foi aprovada e, feliz da vida, comemorou ter tirado sua primeira carteira de motorista aos 91 anos. Viveu mais 13 anos. Com a mesma idade, Hulda Crooks, uma canadense de sorriso doce e olhos miúdos, escalou o monte Whitney, o mais alto pico no território continental norte-americano. Arthur Rubinstein, pianista, escreveu sua biografia aos 91 anos, se definindo como o “homem mais feliz do mundo”. No ano de 2000 o indiano Fauja Singh perdeu sua mulher e filho e se mudou para a Inglaterra. Estava com 89 anos quando decidiu começar a correr. Completou oito maratonas. A última foi aos 100 anos de idade no Canadá, perfazendo os 42km em 8 horas, 25 minutos e 16 segundos. Já o grego Dimitrion Yordanidis completou mais uma maratona em Atenas aos 98 anos. Seu tempo foi de 7 horas e 33 minutos.
 O maestro Leopold Stokowski assinou um contrato de seis anos, aos 94 anos de idade. Aos 102 anos de idade, em março de 1971, Alice Pollock de Haslemere, Inglaterra, publicou seu primeiro livro, Portrait of My Victorian Youth. Pablo Picasso, que dispensa apresentações, morreu no ano de 1973 aos 91 anos de idade. Na noite anterior esteve com amigos até tarde. Depois que eles foram embora foi para o seu ateliê e pintou até três horas da manhã. Bem mais jovem, na faixa dos 80, Benjamin Franklin, presenteou o mundo com mais uma de suas muitas invenções: os óculos bifocais. Quem chega aos 65 anos de idade deve se aposentar, certo? Não para o coronel americano Harland Sandres que, falido, viajou por todo o país à cata de interessados em comercializar sua receita especial de frangos fritos. Ali começava seu império que viria a se chamar KFC (Kentucky Fried Chicken).
O que todas essas pessoas têm em comum além de uma idade considerada avançada? O desejo de continuar vivendo plenamente. De produzir, criar, se reinventar, de ir à luta e não deixarem que a idade fosse um fator impositivo de viver a vida como deve ser vivida. De aproveitar ao máximo o presente. Não se aposentaram de si mesmas. Não sofreram de um mal que tende a dominar pessoas de todas as idades: a desnutrição emocional que faz minguar nossa vontade de viver plenamente. Que nos faz desistir antes mesmo de tentarmos.
Não precisamos escalar um monte ou correr uma maratona, mas podemos e devemos viver com mais leveza, com mais vida! Todos nós perdemos a juventude, mas não necessariamente a jovialidade. Para isso é essencial gostarmos de nós mesmos! Respeitar nossas limitações decorrentes da idade, mas não deixarmos que elas nos imobilizem. Focarmos mais nas nossas liberdades que nas nossas limitações. Cultivarmos diariamente o prazer de viver, criando atividades que nos tragam motivos para levantarmos da cama todo dia. Criarmos vínculos e laços com outras pessoas. Termos um propósito e nos sentirmos pertencentes ao mundo que nos cerca. Criarmos possibilidades que nos tragam energia e motivação para viver.
Nosso cérebro, ao contrário do que se pensava até muito pouco tempo, tem capacidades ilimitadas até o fim dos nossos dias. E ele se nutre da qualidade dos nossos pensamentos. Por isso uma visão positiva de si mesmo, ou seja, uma autoestima e autoconfiança elevadas, são determinantes para uma melhor qualidade de vida. É fácil entender isso, considerando que, em média, passam cerca de 60 mil pensamentos por dia na nossa cabeça. E cada um desses pensamentos faz com que o nosso cérebro produza uma série de substâncias que afetam nosso organismo, mesmo que, conscientemente, não tenhamos noção de um décimo desses pensamentos diários que nos visitam. Sentir-se mal consigo mesmo, ser bombardeado por pensamentos destrutivos e negativos nos intoxica de uma forma brutal.
Uma âncora tem cerca de 1% do peso do navio e, mesmo assim, o prende. O impede de seguir adiante. Pensamentos negativos e nocivos atuam como âncoras em nossas vidas. Não nos deixam seguir em frente.
Toda jornada começa com um primeiro passo e para vivermos melhor e mais plenamente, o primeiro passo é o autoconhecimento. Conhecermos nossa essência. Saber ao certo o que nos estimula, o que nos move, o que nos freia, o que nos agrada e nos desmotiva. São as nossas emoções que nos inundam todo o tempo que dão o tom das nossas vidas. Que nos fazem colocarmos um pijama e ficarmos diante de uma TV ou sairmos em busca de um viver mais saudável e prazeroso. Cuidar da qualidade das nossas emoções inclui cuidar dos nossos relacionamentos, entender as emoções dos que nos rodeiam, desenvolver a capacidade de empatia e escuta. Escutarmos não só com os ouvidos, mas principalmente com o coração e os olhos. Todos somos seres únicos, mas não somos ilhas. Não nascemos para vivermos isolados. Somos seres sociais.
Avanços tecnológicos e na medicina aumentaram a quantidade de anos de vida. Aumentarmos a qualidade desses anos excedentes com o qual fomos presenteados, depende de nós. Do desenvolvimento da nossa inteligência emocional. A boa notícia é que essa inteligência tende a aumentar com a idade, fruto da nossa experiência, das nossas vivências, mas nos cabe dar uma ajuda à natureza. Nos últimos dez anos a ciência descobriu, e entendeu, mais sobre o cérebro humano do que nos últimos dois mil anos anteriores. E foram essas descobertas valiosas que nos deram o caminho das pedras para vivermos com maior qualidade de vida. Recursos tecnológicos nos permitiram mapear e compreender melhor as emoções e suas influências em nossas vidas. E uma das grandes lições que aprendemos foi a de que emoções são contagiosas. Por isso nos cercarmos de pessoas que nos façam mais felizes e positivas, tragam mais disposição, esperança e felicidade. E, assim, o ciclo se fecha de uma forma saudável porque quando estamos mais felizes contagiamos as pessoas à nossa volta. Já o contrário, ou seja, os encontros tóxicos com pessoas que são verdadeiros vampiros emocionais, que sugam nossa alegria e nossa energia, nos fazem um grande mal à saúde. Tenho uma conhecida, por exemplo, que se telefono para ela e pergunto se está tudo bem e ela responde que está, desligo o telefone porque é engano.
Estamos vivendo um momento especialmente difícil, sendo bombardeados por notícias ruins e precisamos, mais do que nunca, nos proteger disso. Não nos deixarmos contaminar. Uma recente pesquisa desenvolvida na universidade de Stanford concluiu que meia hora de negatividade pode danificar o nosso cérebro. Seja quando reclamamos, escutamos reclamações, lemos ou ouvimos notícias ruins. Meia hora!! Por isso precisamos abastecer nossos cérebros com pensamentos que nos façam seguir adiante com disposição e confiança, sem âncoras emocionais. Que nos façam viver mais plenamente, criar mais e manter nossa mente e corpo ativos. Por isso criATIVE-SE! E faça com que sua vida seja muito melhor! 
Andréa Cordoniz
Setembro 2017



segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Muitas vezes queremos ser como os outros não são



   Em todas as minhas palestras sobre o livro Exorcize Sua Alma Gorda faço questão de dizer o quanto é importante nos sentirmos confortáveis com nossos corpos e, sobretudo, saudáveis. Lembro que uma vez vi, em um grupo de meninas que exaltava a anorexia como estilo de vida e não como doença, menção ao meu livro o que me deixou profundamente triste! 
   Hoje, com os recursos fotográficos e cosméticos que dispomos, pessoas se apresentam tão irreais como a Branca de Neve. Ou mais. Por isso gosto quando nos deparamos com essas pessoas como de fato são. Nem sempre mais feias, diga-se de passagem. Simplesmente mais naturais e humanas, digamos.
   Acho maravilhoso nos produzirmos e nos cuidarmos. Assim nossa autoestima fica em alta e só temos a ganhar com isso, mas não devemos nunca, em hipótese alguma, buscarmos ser tal e qual os outros não são. 


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quarta-feira, 24 de setembro de 2014

"Portuglês": o novo dialeto corporativo


Dominar o inglês faz tempo que deixou de ser uma opção para se tornar uma obrigação no mundo empresarial, na maioria esmagadora das organizações! Além de necessário, considero bacana pessoas que falam mais de um idioma. Mas um de cada vez. Diferente do que estamos vendo atualmente. O mundo corporativo está falando um verdadeiro dialeto composto de um misto esdrúxulo de português com inglês.

                Não quero de forma alguma parecer anacrônica ou rígida e implacável defensora do nosso idioma, negando as evidências circundantes, a começar pela globalização que veio para ficar.  Seria ignorância de minha parte professar uma linguagem hermética e imutável, blindada a empréstimos e incorporações necessárias que fazem parte desse processo dinâmico de renovação do idioma.  Palavras sofrem constantes influências e consequentes alterações em função de fatores como economia, ciência, organização da sociedade e movimentos sociais, dentre outros.  Estrangeirismos fazem parte desse processo. A escolha do idioma inglês como “universal” nesse mundo globalizado, reflete, certamente, uma dominação econômico e cultural dos EUA. O que não podemos admitir é um empobrecimento do nosso idioma, um dos mais belos da humanidade. Nem permitir deformações escabrosas por conta desse excesso.

                Nas organizações temos visto uma comunicação contaminada. O tal dialeto Portuglês que me soa histriônico, tolo. Vejo estarrecida profissionais cometendo erros crassos da nossa língua pátria e que, no entanto, possuem domínio fantástico da língua do Tio Sam. Pessoas que, por exemplo, cuidam com o maior esmero e atenção da pronúncia correta das palavras em inglês, visando parecer um nativo, mas que cometem erros de pronúncia horrorosos no seu próprio idioma. Em uma apresentação de mais de oito horas de duração de diversos profissionais brasileiros que atuam em uma organização multinacional, por exemplo, constatei que todos adotaram uma pronúncia americanizada da palavra “recorde”, que vem sendo dita récord. O mesmo fenômeno, por sinal, acontece em empresas de rádio e televisão.

                E por falar em televisão, não sei se por ler na mesma cartilha, Aguinaldo Silva, autor da novela das nove, criou seu protagonista, um executivo bem sucedido, brasileiríssimo, de origem humilde que chegou ao topo da carreira, falando despropositadamente palavras em inglês em profusão. O resultado é algo tosco. E, cá para nós, nada diferente do que estamos vendo nas organizações: a inclusão bizarra de palavras inglesas que também sofrem adulterações de arrepiar. E assim ouvimos pessoas dizerem que estão brifando documentos, trackiando outros, solicitando papers, buscando administrar conflitos através de uma abordagem mais friendly, praticando encontros one to one, almejando maior visibility para suas áreas, defendendo seus targets, preocupados com seus pipelines, deadlines e budgets, antenados nos gaps que possam surgir aqui e ali, dando feeds sobre novos conceitos a serem implementados, fazendo constantemente recapts do que viram, lidando em suas rotinas com diferentes moods que possam afetar o entrosamento e por aí vai! Não há limites para a inclusão de words inglesas em suas falas e apresentações. Não precisamos ser radicais a ponto de substituir feedback por retroalimentação, mas fazer essa miscelânea soa arrogante e despropositado! Sem falar que pode comprometer a essência da comunicação, nossa mais valiosa ferramenta de interação interpessoal.

Outra situação que nos chama a atenção nesse universo é o número alarmante de lojas e empreendimentos que optaram por nomes em inglês ou que se utilizam desse idioma para dar seus informes, como chamar “promoção” ou “liquidação” de sale. Um rapaz que presta serviços em minha casa, por exemplo, passou dias tentando explicar em que local ficava a agência bancária em que tinha conta. Insistia em mencionar que era no Frescobol. Intrigados, fomos descobrir no dia em que meu marido ofereceu uma carona, que ele queria dizer Fashion Mall. Alguns representantes dos lojistas no Brasil já alertaram para o fato de que trabalhadores de origem mais simples, como entregadores, referem-se a esses empreendimentos por nomes indecifráveis, como fez meu funcionário, ou por cores das fachadas.


                Esse dialeto bizarro está abastecido de distorções que nem mesmo os dicionários conseguem nos elucidar e situar. Respingos disso vêm contaminando e truncando o significado de palavras do nosso idioma que passaram a ganhar significados errôneos. O mais gritante é o do verbo realizar, que, em português significa constituir; efetuar; elaborar; executar; fazer, mas que vem sendo empregado com o significado de “realize”, em inglês, que corresponde a “perceber”. Assim: “diante daquele problema eu realizei que algo sairia errado”. Ou a adoção do “então” no início da frase como fazem os americanos com o seu “well”. E o que dizer da nefasta utilização do gerundismo que, graças aos céus, saiu de moda? Vamos falar diversos idiomas, mas um de cada vez!