Dominar o
inglês faz tempo que deixou de ser uma opção para se tornar uma obrigação no
mundo empresarial, na maioria esmagadora das organizações! Além de necessário,
considero bacana pessoas que falam mais de um idioma. Mas um de cada vez. Diferente do que estamos vendo atualmente. O mundo
corporativo está falando um verdadeiro dialeto composto de um misto esdrúxulo
de português com inglês.
Não quero de forma alguma
parecer anacrônica ou rígida e implacável defensora do nosso idioma, negando as
evidências circundantes, a começar pela globalização que veio para ficar. Seria ignorância de minha parte professar uma
linguagem hermética e imutável, blindada a empréstimos e incorporações
necessárias que fazem parte desse processo dinâmico de renovação do
idioma. Palavras sofrem constantes
influências e consequentes alterações em função de fatores como economia,
ciência, organização da sociedade e movimentos sociais, dentre outros. Estrangeirismos fazem parte desse processo. A
escolha do idioma inglês como “universal” nesse mundo globalizado, reflete,
certamente, uma dominação econômico e cultural dos EUA. O que não podemos
admitir é um empobrecimento do nosso idioma, um dos mais belos da humanidade. Nem
permitir deformações escabrosas por conta desse excesso.
Nas organizações temos visto uma
comunicação contaminada. O tal dialeto Portuglês que me soa histriônico, tolo.
Vejo estarrecida profissionais cometendo erros crassos da nossa língua pátria e
que, no entanto, possuem domínio fantástico da língua do Tio Sam. Pessoas que,
por exemplo, cuidam com o maior esmero e atenção da pronúncia correta das
palavras em inglês, visando parecer um nativo, mas que cometem erros de
pronúncia horrorosos no seu próprio idioma. Em uma apresentação de mais de oito
horas de duração de diversos profissionais brasileiros que atuam em uma
organização multinacional, por exemplo, constatei que todos adotaram uma
pronúncia americanizada da palavra “recorde”, que vem sendo dita récord. O mesmo fenômeno, por sinal,
acontece em empresas de rádio e televisão.
E por falar em televisão, não
sei se por ler na mesma cartilha, Aguinaldo Silva, autor da novela das nove,
criou seu protagonista, um executivo bem sucedido, brasileiríssimo, de origem
humilde que chegou ao topo da carreira, falando despropositadamente palavras em
inglês em profusão. O resultado é algo tosco. E, cá para nós, nada diferente do
que estamos vendo nas organizações: a inclusão bizarra de palavras inglesas que
também sofrem adulterações de arrepiar. E assim ouvimos pessoas dizerem que
estão brifando documentos, trackiando outros, solicitando papers,
buscando administrar conflitos através de uma abordagem mais friendly,
praticando encontros one to one, almejando maior visibility
para suas áreas, defendendo seus targets, preocupados com seus pipelines,
deadlines
e budgets, antenados nos gaps que possam surgir aqui e ali,
dando feeds sobre novos conceitos a serem implementados, fazendo
constantemente recapts do que viram, lidando em suas rotinas com diferentes moods
que possam afetar o entrosamento e por aí vai! Não há limites para a inclusão
de words
inglesas em suas falas e apresentações. Não precisamos ser radicais a ponto de
substituir feedback por retroalimentação, mas fazer essa miscelânea soa
arrogante e despropositado! Sem falar que pode comprometer a essência da
comunicação, nossa mais valiosa ferramenta de interação interpessoal.
Outra situação que nos chama a atenção nesse universo é o número
alarmante de lojas e empreendimentos que optaram por nomes em inglês ou que se
utilizam desse idioma para dar seus informes, como chamar “promoção” ou
“liquidação” de sale. Um rapaz que presta serviços em minha casa, por exemplo,
passou dias tentando explicar em que local ficava a agência bancária em que
tinha conta. Insistia em mencionar que era no Frescobol. Intrigados,
fomos descobrir no dia em que meu marido ofereceu uma carona, que ele queria
dizer Fashion Mall. Alguns representantes dos lojistas no Brasil já
alertaram para o fato de que trabalhadores de origem mais simples, como
entregadores, referem-se a esses empreendimentos por nomes indecifráveis, como
fez meu funcionário, ou por cores das fachadas.
Esse dialeto bizarro está
abastecido de distorções que nem mesmo os dicionários conseguem nos elucidar e
situar. Respingos disso vêm contaminando e truncando o significado de palavras do
nosso idioma que passaram a ganhar significados errôneos. O mais gritante é o do
verbo realizar, que, em português
significa constituir; efetuar; elaborar;
executar; fazer, mas que vem sendo empregado com o significado de “realize”,
em inglês, que corresponde a “perceber”. Assim: “diante daquele problema eu realizei que algo sairia errado”. Ou a
adoção do “então” no início da frase como fazem os americanos com o seu “well”. E o que dizer da nefasta
utilização do gerundismo que, graças aos céus, saiu de moda? Vamos falar
diversos idiomas, mas um de cada vez!