segunda-feira, 8 de julho de 2013

Dialeto Corporativo Coleção Outono Inverno


Tempos atrás escrevi um artigo para a revista Exame mencionando o uso abusivo de palavras estrangeiras, sobretudo no mundo organizacional. De lá para cá, nada mudou: continuo escrevendo summarys, fazendo folow-ups, recebendo papers, dando e recebendo feedbacks, fazendo approachs, seguindo o script do casual day, mantendo-me atenta ao background, mencionando diversos cases, participando de brainstorms, fazendo briefings disso e daquilo, desenvolvendo business games para instrutoria e trainnes, desenvolvendo minha expertise, partilhando ao máximo todo o meu know-how, discutindo políticas de implacement, tendo excelentes insights, prevendo e reformulando gaps indesejáveis, dando treinamentos in company, preferencialmente através de uma política just-in-time, falando em coaching, drawback, prospects, budget, stakeholders, team, mentoring...
            Mas nem só de estrangeirismo vive o dialeto corporativo. Termos entram e saem de moda e é preciso estarmos atentos para não sermos taxados de “cafonas organizacionais”.
            Quem lembra, por exemplo, que “cliente” já foi “freguês”? Ou que “investimento” de uma consultoria já foi “preço”? Os atuais “colaboradores” também já responderam pela alcunha de “empregados” ou “funcionários”. Antigamente fazíamos “gancho” com algo que era dito e hoje fazemos “link”. Trabalhávamos em “empresas”, “fábricas”, “lojas” ou “escritórios”, enquanto hoje trabalhamos em “organizações”, “corporações” e “empreendimentos”. O que era “difícil” passou a ser “desafiador”. Se você hoje é “gestor” saiba que até pouco tempo atrás seria denominado de “gerente” e mais tempo ainda atrás de “chefe” (palavra que deve fazer pelo menos meia dúzia de leitores isolarem na madeira – toc, toc, toc).
            Grande parte do vocabulário que surge é cunhado por gurus corporativos e propagado por seus seguidores. As principais passarelas onde são apresentados os termos da nova estação são os MBAs. Não há quem curse um MBA que não esteja totalmente por dentro do mundo fashion corporativo. E lá vão eles “quebrando paradigmas”, procurando manterem-se “alinhados” com a política corporativa atual, “mantendo o foco” em seus objetivos, esforçando-se para atuarem proativamente, desenvolvendo a capacidade de “resiliência” e coisas do gênero.
            Um parêntese: alguns termos me chamam a atenção e me fazem pensar e outros, confesso, me soam profundamente bobos. Sim, bobos, tolos! Um deles, muito usado nas melhores corporações do mundo é “serviço voltado para resultados”. Pergunto, eu: não fosse ele voltado para resultados, para que seria? Para “fazer por fazer?”, “Fazer para ver no que vai dar?”.     
            Assim como o estrangeirismo, o importante é evitarmos exageros que levam legiões de profissionais a fazerem discursos quase iguais, ou seja, se utilizando de uma linguagem pasteurizada e artificial, o que se acentua ainda mais com a globalização. Encontramos empreendedores dos mais diversos países com discursos de uma semelhança assombrosa. Conteúdos muito bem “preparados”, mas em geral carentes de emoção. Pessoas que falam, mas não colocam vida em seus discursos. Uma linguagem impregnada de botox.  Um vocabulário recheado de um modismo engessante e que poderia sair da boca de qualquer profissional de qualquer parte do universo. 
Outra armadilha desse mundo fashion é a utilização de uma linguagem cosmética, ou seja, feita para maquiar um conteúdo que das duas uma: ou é um conteúdo pobre, sem consistência nem essência, tal e qual anúncios de Classificados de segunda-feira, ou que precisa de retoques e camuflagens para disfarçar imperfeições. Resumindo: para fazer o texto parecer melhor do que é. Seu autor capricha na maquiagem para impressionar. Nos dois casos, porém, o problema é quando lavamos o rosto e apresentamos o discurso de cara limpa. Se o seu conteúdo não for bom, não se sustentar, ao retirarmos todos os estrangeirismos e modismos, temos uma triste surpresa.
É preciso cuidado também, pois a maciça utilização desse vocabulário corporativo, com suas tendências e influências, cheira a jargão, coisa que toda e qualquer orientação empresarial reprova.
Conteúdos realmente bons (e principalmente) feitos numa linguagem simples, clara e objetiva, continuam tendo valor! Valor esse gerado justamente por sua objetividade e clareza.


Andréa Cordoniz

Um comentário: